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Problemas da democracia brasileira

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No livro Ciências Políticas, de Paulo Bonavides, evidencia-se que a democracia, em seu surgimento, consistia na participação popular dos cidadãos na pólis, permitindo a isonomia e participação deles em quaisquer funções públicas, sendo assim, era percebida o funcionamento de uma democracia direta. Com o advento da globalização e do surgimento de Estados de grandes extensões, sabia-se que a democracia direta não mais seria cabível. Antes do período das grandes guerras, tentou-se instaurar democracias semi-diretas, as quais, em suma, haviam dispositivos que permitiriam a participação popular direta nos assuntos de maiores interesses públicos. No período entre e pós guerras, muitos desses sistemas foram interrompidos por governos primordialmente autoritários. Alguns, com o fim das ditaduras, estabeleceram a democracia indireta representativa, como é o caso do Brasil. Entretanto a república federativa brasileira apresentou corrompimento no devido funcionamento deste sistema e sua população reivindica reforma política.
É perceptível o exercício da democracia, por ironia, antes da queda da ditadura e da posterior redemocratização do país. Desde a marcha dos cem mil e, principalmente, das Diretas Já, percebia-se uma população consciente, com vontade de democratizar o Estado e, inclusive, ativista. Havia a completude dos preceitos democráticos - a vontade da soberania posta no poder do povo-. Com a redemocratização, percebeu-se um povo ainda consciente sobre a importância das manifestações. No presidencialismo de Collor, por exemplo, havia a manifestação conhecida como os "caras pintadas".
Já as manifestações de junho de 2013, em muito se assemelha com os "movimentos dos indignados", na Espanha. Os de Junho, primeiramente, saíram para protestar contra o aumento das tarifas dos transportes públicos; por fim, houve a dispersão dos motivos das aclamações e repercutiu que protestavam "contra tudo". Essa mesma crítica é feita ao "movimento dos indignados" que apesar de acamparem e possuir pautas, as divergências e ausência de "líderes" dificultou o atendimento dos interesses postos em conflito e, dessa forma, em nada diminuiu a crise da Espanha. O mesmo ocorreu no Brasil, apesar de voltarem atrás com o aumento da tarifa no estado de São Paulo, onde iniciaram as manifestações.
Em 2016, novamente foi exercido o poder da democracia, no Brasil, apesar de, dessa vez, estar mais dicotômica, polarizada. No dia 13 de março, viu-se sair à rua, uma classe predominantemente média, pedindo o impeachment da presidente Dilma Rousseff, estendendo cartazes e camisetas com os dizeres "nós confiamos em Moro", juiz Paranãense, o qual também foi criticado pela classe dos magistrados, pela quebra de sigilo. Houveram, concomitantemente, manifestações pró governo naquela semana e nas que sucederam, retificando como em uma democracia é legitima manifestações contra e a favor do governo vigente. Um dos principais problemas enraíza-se quando pequenos grupos reivindicam retrocesso, como houveram conservadores pedindo retorno da ditadura militar. N'outro âmbito, também é preocupante perceber que há mais interesses políticos com o a afastamento da presidenta eleita, do que o uso do dispositivo como algo jurídico em si.
Sobre, ainda, a conjuntura da democracia brasileira, percebem-se muitos mecanismos que dificultam seu sucesso. Primeiramente, o multipartidarismo e a pouca burocracia para a criação de novos partidos, necessitando de um número mínimo de assinaturas basicamente (enquanto escrevo essas palavras, há poucos meses foi noticiado o projeto de criação do Partido Nacional Corinthiano). Esse processo de criações de diversos partidos acarreta em dispersões como financiamento indevido e falta de ideologia concreta a ser seguida, fazendo-nos, muitas vezes, votar no "indivíduo", ignorando projetos de seu partido. Outro entrave é o presidencialismo de coalizão, que discorrerei ao longo do texto, sendo outro dificultador da governabilidade e permite abertura para atendimento de interesses pessoais, como desvio do dinheiro público. Outra questão complicadora são as tão utilizadas atualmente, delações premiadas, considerada como "faca de dois gumes" pois, enquanto pode ajudar investigações, pode da mesma forma facilitar a sanção do réu já condenado. Assim, nota-se que há vários motivos para a remanescência da corrupção no sistema, não permitindo o sucesso da democracia no Brasil. Isso, sem entrar no mérito do alto custo, causado pela enormidade quantitativa de políticos no congresso nacional brasileiro, sustentados por dinheiro público.
O texto "colapso da democracia", de Luis Felipe Miguel, disponível no blog da Boi Tempo, evidencia como o interesse do capital agravaram nossa situação política. Para o texto, há uma dicotomia entre a esquerda, que apesar dos pesares, pede garantia da igualdade política e entre os conservadores, alegando a necessidade da defesa da "maioria", a classe média e alta, se atentar então a vontade da burguesia, do livre mercado. Os explorados serão utilizados como massa de manobra, alienados pelos grandes meios de comunicação os quais são monopólio dos detentores do poder econômico e político. No texto Apocalipse do jornalismo, de Mario Vitor Santos, é possível analisar, de certa forma, a degradação do jornalismo para promover ascensão dos interesses dos detentores do capital. Karl Marx, em sua análise materialista histórico dialética, dirá que o proletariado para se abster dos interesses burgueses, precisa obter sua consciência de classe e instaurar a ditadura do proletariado, através da revolução. Em contraposição, exposto no texto de Luis Felipe Miguel, o Partido dos Trabalhadores não tem se disposto a prestar mudanças mais profundas, principalmente no âmbito educacional, que permitiria ao proletariado adquirir noções de sua exploração. Ao invés disso, tentou causar uma acomodação, disfarçada de satisfação, principalmente das camadas mais baixas, tentando transforma-los minimamente em consumidores (melhorando suas condições de vida, com medidas assistencialistas), e altas (sim, se atentou também ao interesse de grandes empresários, por exemplo). Dessa forma, o PT diminuiu um pouco a disparidade de classes, incomodou a classe média, mas não estabeleceu mudanças significativas no âmbito da luta de classes. Os trabalhadores seguem sendo explorados pelos detentores dos meios de produção -pelo menos, ainda não tentaram modificar leis trabalhistas, como ocorreu esse ano na França, palco de grandes reivindicações para impedir essas modificações-.      
 O texto de Luis criticará também o caráter enviesado, politicamente falando, ao haver credulidade em um impeachment sem crime de responsabilidade e conceituando o princípio de intercambialidade (nenhum grupo ou indivíduo tem poder de veto sobre a maioria gerada nas urnas, salvo as exceções presente na constituição).  Porém, Dilma foi afastada, mesmo com seus 54 milhões de votos, o texto então retificará que o governo Temer não pode ser considerado "democrático". É com essa informação que surgiu a concepção do termo "golpe", bastante pronunciado no cenário político atual. Pode-se dizer, então, que a corrupção e a soberania dos detentores do capital corrompeu a democracia brasileira -O que Aristóteles classificaria como o estado impuro da democracia: A demagogia-. É também notável na política brasileira, a "banalização do mal", de Hanna Arendt, quando ouve-se políticos sendo eleitos com a repetição do slogan "rouba mas faz".
A realidade do governo brasileiro vem passando por conturbações, havendo de fato, uma atual crise política e econômica. A democracia representativa presidencialista encontrou, no Brasil, grandes entraves, como a corrupção partidária e o presidencialismo de coalizão. Este último, ao distribuir cargos, para permitir ao executivo, sua governabilidade, acaba enviesando decisões ao interesse particular, constrói relações políticas frágeis, acentuada por divergências ideológicas e pela falta de representação dos interesses da população.
Com a ascensão do Partido dos Trabalhadores ao poder, principalmente ao cargo de maior respaldo, o de presidente da república, parecia haver uma velada alteração na governabilidade, para se atentar aos anseios da população -principalmente às classes mais baixas-. Foi constatado, sim, medidas assistencialistas, programas para promover a ascensão social dos mais desfavorecidos, tentativas de transforma-los em consumidores e 1/3 da população saiu da considerada "fome extrema", garantindo reconhecimento internacional ao Brasil. Entretanto, esse mesmo partido não pôde se desvincular de interesses internos e externos, que agravariam na crise econômica e também não se desfez do presidencialismo de coalizão. Não sendo tão populista e popular como o ex-presidente, do mesmo partido, Luiz Inácio Lula da Silva, a atual presidente (sim, atual, o vice-presidente Michel Temer é presidente interino em exercício, mas o cargo continua sendo da presidenta afastada Dilma Rouseff) encontrou dificuldades para garantir sua governabilidade. Além de ter sofrido com o rombo da Petrobrás, grande empreiteira brasileira, processos para averiguar acusações de recebimento de propina à políticos do seu e de outros partidos, acirramento das investigações da "lava Jato", houve uma espetaculização midiática e de governantes, afim de diminuir ainda mais a popularidade da presidente, com uma perspectiva de "quanto pior, melhor", para alcançar apoio popular ao processo de Impeachment, acusando Dilma de crime de responsabilidade, tendo sido este, dessa vez, um dispositivo mais político que jurídico.
Após o andamento do processo de impeachment -conduzida pelo réu Eduardo Cunha, atualmente afastado do seu exercício de presidente da câmera dos deputados- a presidente, após ratificação de minoria simples dos senadores, fora afastada de seu cargo, assumindo assim o vice-presidente Michel Temer. Prometendo "progresso" positivista e "união" da nação, Temer, até o momento, não diminuiu o cenário da crise política, afinal não houve o fechamento da lava jato (vontade de vários políticos com envolvimento), houve a prisão do "japonês da federal", ícone das manifestações contra o governo do PT, dentre outras polêmicas. Ao literalmente mostrar falta de representação e interesses do coletivo que não serão atendidos no governo Temer, como projetos de privatização da Casa da moeda, diminuição da extensão do sus, retirada da bolsa permanência em universidades e suspensão de FIES e PROUNI, em 9 instituições de ensino superior até o momento, percebe-se que, além de não alterar as verdadeiras causas do problema (como o presidencialismo de coalizão e a corrupção partidária), há grandes possibilidades de o governo Temer também destituir sucessos alcançados durante os 12 anos de governo Petista. Isso é perceptível, por exemplo, ao analisar os primeiros ministros escolhidos para governar, junto a Temer: todos homens, brancos, detentores do capital (não entrando no mérito de escolher apenas por gênero ou raça, mas será que nenhuma mulher e negros, maioria da população, teria capacidade para exercer se quer um cargo?). Sete dos ministros estavam envolvidos em delações na investigação da Lava Jato e havia ocorrido a extinção do ministério que, posteriormente, Temer voltou atrás na decisão, após reivindicações. As panelas dos manifestantes Anti-PT seguiram guardadas. Como afirmou Pablo Villaça "A questão ali NUNCA foi 'corrupção', mas o ódio a qualquer política minimamente considerada de esquerda". A mídia e a população agora aceita diversas atitudes que seriam completamente inaceitáveis caso tomadas pela presidente Dilma. O desvalorização do dólar no governo Dilma era sinal de problemas arraigados a desvalorização do Real, agora no governo Temer o "dólar movimenta a economia ao atrair turistas".
Por outro lado, há quem acredite na superação desse sistema se, por exemplo, fosse adotado o sistema parlamentarista, havendo polarização de partidos, com fortes linhas ideológicas. Com a câmera baixa constituída de ministros eleitos pelo povo, há quem argumente que seria superada a corrupção do presidencialismo de coalizão. Ademais, é acordo comum, a necessidade de investimento maciço em educação -há cerca de 5% investido do PIB em educação, tendo em vista a quantidade populacional em idade estudantil e as estatísticas referente aos que completam ensino fundamental, médio e superior, estimasse que deveria haver investimento de 10%-. Uma população educada constituiria um Estado mais propício ao progresso em vários aspectos da sociedade e, de certa forma, diminuiria a presente corrupção enraizada, já que esta se mostra como um fenômeno cultural.


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